quarta-feira, 16 de maio de 2012

A LÓGICA DA PRESSA

Às 8:00 horas acordo. Levanto. Escovo os dentes. Tomo café. Vou até à cama. Dou um beijo de despedida na minha esposa. Saio.
Espera! Esqueci de trocar de roupa.
Volto. Troco de roupa. Vou até à cama. Dou outro beijo de despedida na minha esposa. Saio.
Vou para o ponto de ônibus. Encontro a vizinha da frente. Cumprimento-a. Ela me pergunta a hora. Respondo “8:00 horas”. Depois percebo que meu relógio parou. Que horas são? Vou me atrasar!
Corro até a estação de trem mais próxima. Vou comprar uma ficha. Vejo que esqueci minha carteira! Decido pedir dinheiro emprestado à vizinha da frente. Volto correndo para o ponto de ônibus. A vizinha da frente acaba de pegar o ônibus.
Procuro o celular para ligar para o trabalho. Esqueci o celular! Resolvo ir correndo para casa. Pego um atalho. Chego em casa. A porta está trancada. A minha esposa saiu! Aonde ela foi? Talvez comprar pão.
Corro para a padaria. Não cumprimento o padeiro. Olho o interior do estabelecimento. Ela não está! Peço dinheiro emprestado ao padeiro. Ele pergunta o porquê? Eu conto a história. Ele diz que me empresta se eu comprar uma sacola de pão. Eu digo que não tenho dinheiro. Ele me diz que então não tem pão. Eu digo que eu não quero pão e sim dinheiro. Ele diz que ali é uma padaria e não um banco. Filho da p... Nunca fui amigo do padeiro. Um senhor que estava do meu lado e ouviu a história me emprestou o dinheiro. Agradeci e sai correndo para o ponto de ônibus.
Chego no ponto de ônibus e encontro minha esposa. Pergunto o que ela está fazendo ali. Ela me pergunta a mesma coisa. Conto a história. Ela começa a dar risada.
- Meu bem, você esqueceu que hoje é sábado?
-Sábado?
- É. Hoje não tem trabalho.
-...
Chegando em casa minha esposa começa a analisar a  história:
-Olha só. Por que você não ficou esperando o ônibus? Quando visse que estava sem a carteira bastava pedir dinheiro emprestado a vizinha da frente.
-Eu achei que estava muito atrasado.
-E se estava tão atrasado porque não pediu dinheiro a alguém na estação do metrô?
-É... Eu não pensei nisso.
-E já que você entrou e saiu duas vezes de casa, porque não usou sua chave quando viu a porta trancada?
-Bom... Eu esqueci que estava com ela. E por que você tinha saído?
-Eu fui até o ponto de ônibus pra te avisar que não tinha trabalho hoje. E se você não tivesse pegado o atalho me encontraria no caminho. E por que você achou que eu iria para a padaria? Eu nem gosto daquele padeiro!
-... Ok, mas mesmo sabendo que não tem trabalho hoje eu ainda acho que tinha alguma coisa importante pra fazer.
-Sim meu bem. Exercícios. Mas já que você correu tanto eu acho que não precisa mais!
No outro dia resolvo ir a um consultório que fica do outro lado da rua pra tratar essa meu problema de amnésia. Quando entro no consultório encontro o senhor que havia me emprestado o dinheiro.
- O senhor é o doutor?
-Sim. E você é o homem que me pediu dinheiro emprestado ontem. Num é verdade?
-Ah sim. E muito obrigado de novo. Deixa eu só pegar a...
-O que foi?
-Esqueci minha carteira.
MAX
AQUELA DA CANETA

Certo dia, entrei numa loja. Dessas que vendem material escolar. Dei uma olhada rápida em seu interior. Tinha de tudo um pouco. Dirigi-me até o balcão onde encontrei um rapaz ruivo e cheio de sardas. Devia ter uns 17 anos. Jeito despreocupado como se já tivesse ganhado o mundo e não tivesse nada a perder.
Falei em um tom casual:
- Me vê aí uma caneta.
- Qual delas?
            Não sei se ele estava sendo irônico ou se era seu modo de falar. Desconsiderei.
- Pode ser uma bic.
- Qual delas?
            Dessa vez fiquei intrigado. Será que eu estava na frente de um andróide alienígena que conhecia apenas uma frase da nossa língua? Talvez aquelas sardas servissem como distração enquanto ele montava sua arma intergaláctica, que estava atrás do balcão, para usá-la em mim. Talvez ele já tivesse feito isso com outras pessoas. Afinal, a loja não estava muito movimentada. Espera aí. Não tinha ninguém!
            Quando eu estava me preparando pra sair correndo, o ‘alien’ falou:
-Temos a bic normal e a ‘super’ bic.
            Olhei-o com certa desconfiança.
- E qual é a diferença?
            Perguntei ainda desconfiado.
- A ‘super’ bic possui um dispositivo de encapsulamento.
            Ele falou com uma naturalidade que me incomodou. Como se todos soubessem que a ‘super’ bic possuia um dispositivo de encapsulamento. Ou pior, como se todos soubessem que existia uma ‘super’ bic.
 Fiquei lá parado, como se fosse o cara mais desinformado da face da terra. Então para tentar adquirir algum respeito, ante aquele extraterrestre, eu disse:
- Ah claro! A ‘super’ bic. Já tava esquecido. Faz tempo que eu não a uso.
            Agora eu parecia ser o cara mais idiota da face da terra. Mas não podia deixar-me abalar. Muito menos demonstrar fraquezas! Então, como se fosse o maior entendedor de canetas, falei num tom despreocupado:
- Me dá uma ‘super’ bic mesmo.
            Num movimento mecânico, o ‘alien’ colocou a mão atrás do balcão – o que me deixou muito tenso – e retirou uma caneta bic, colocando-a na minha frente.
            À primeira vista eu não vi nada diferente. Nem à segunda. Nem à terceira... Era uma caneta comum!
- Mas peraí. É uma caneta comum!
- Errado. Ela possui um dispositivo de encapsulamento.
            Daí ele pegou a caneta; retirou e colocou a tampa três vezes. E enquanto ele fazia isso, me olhava com uma cara de: “será que esse idiota já usou mesmo uma ‘super’ bic?”.
            Eu me encontrava entre a indignação e a fúria.
- Que palhaçada é essa? Isso é apenas uma tampa!
- Errado. É um dispositivo de encapsulamento.
- Olha aqui seu...
- O senhor não disse que já tinha usada uma ‘super’ bic?
            O ‘alien’ parecia estar me testando. O pior é que eu já havia dito. Precisava me acalmar e inventar alguma coisa; rápido.
- É...que...a que eu usei era diferente dessa.
            Meu Deus! Nem eu iria cair nessa.
- Então o senhor deve ter usado a ‘mega’ bic.
            Ufa! Pelo visto a minha tirada tinha servido pra alguma coisa. Mas e essa agora?
- ‘Mega’ bic?
- É. ‘Mega’ bic.
- Ah claro! Foi isso.
             Eu não fazia idéia do que era uma ‘mega’ bic. Mas aquela não era mais uma questão de comprar uma caneta. Era uma questão de orgulho! Não podia continuar ali sendo menosprezado por aquele ‘extraterrestre ruivo’.
            Tentei parecer o mais calmo possível. Respirei fundo e disse:
- Então, eu vou comprar uma ‘mega’ bic.
            Repetindo o mesmo movimento da outra vez; retirou outra caneta bic da parte traseira do balcão.
Mas...era impossível. A caneta era exatamente igual à outra!
            Fiquei ali parado um tempão olhando para as duas canetas. Depois de quase três minutos resolvi encarar o ‘alien’.
            Suas sardas me desafiavam. E aquele cabelo ruivo era uma afronta à minha dignidade.
            Ele estava esperando. Esperando que eu fizesse a maldita pergunta. Eu já estava acabado. Não tinha condições de exigir respeito. Afinal, mentira duas vezes. O jeito era me entregar.
- E qual é a diferença?
            Ele sorriu. Era o riso de um carrasco quando está prestes a decepar sua cabeça.
            E foi como um golpe de machado que ele falou:
- A ‘mega’ bic possui um fluido especial para a escrita. Achei que já soubesse.
            O desgraçado interplanetário estava falando da tinta! Era só o que me faltava! Eu não podia acreditar. Aquilo não estava acontecendo comigo. Não. Era impossível!
            Quando eu estava a ponto de esganar o filho – da – mãe, uma senhora materializou-se ao meu lado e pediu, ao ‘alien’, um novelo de lã.
            Santa velhinha do novelo! Se não fosse por ela, talvez eu tivesse iniciado uma guerra entre dois mundos.
            Após ser atendida, ela saiu da loja. E eu fiquei lá. Frente a frente com o extraterrestre. Ele continuava me testando. Talvez ele quisesse que eu o batesse. Assim ele teria um motivo para me desintegrar.
 Mas eu não cedi. Consegui conter meus instintos primitivos e fiz a coisa mais honrosa que podia ter feito: comprei um lápis.
MAX