terça-feira, 17 de maio de 2016

A PINTA


   
   Hoje eu reparei que havia uma pinta no meu dedo. Uma mancha surgiu onde antes era apenas pele. Achei aquilo bastante curioso. E agindo racionalmente e logicamente como toda pessoa racional e lógica age, pensei que iria morrer. Não que estava morrendo. E sim que já iria morrer de fato. Seriam apenas questão de horas para aquele sinal se espalhar e consumir completamente meu corpo. Porque afinal é muito comum disso acontecer. Há diversos casos comprovados cientificamente, milhões de estudos e excelentes filmes trash de ficção científica sobre o assunto.
   Tudo bem. Não pensei exatamente que eram meus últimos momentos, mas confesso que bateu uma certa aflição. Mudanças corporais geralmente não representam algo positivo. Com o passar do tempo a pele vai perdendo elasticidade, os cabelos vão rareando, as juntas endurecendo. E quando tudo isso acontece a gente vira outra gente. Uma gente diferente estetica e psicologicamente.
   Não estou afirmando que todas as mudanças que ocorrem são ruins, mas que só consegui lembrar das ruins. Eu mesmo já posso adicionar pintas na minha lista de “acréscimos diferencias adquiridos ao longo de uma existência terrena”. Ou, “detalhes que terei quando for mais velho”.
   Já deu pra perceber que aquela mancha no indicador me fez pensar bastante, né? Uma coisa tão pequena e que passa despercebida atingiu um destaque enorme em minha discreta vida.
   Mas após muito pensar, deliberar, especular, raciocinar, cheguei à incrível nenhuma conclusão. Porque não havia algo a ser concluído. Todos os meus medos, receios e angústias criados devido ao surgimento da pinta, eram apenas isso: medos, receios e angústias criados por mim.
   Nada do que eu imaginei obrigatoriamente se tornaria real. A única coisa real era a pinta. E ela surgiu sem eu precisar imaginar. Simplesmente estava lá. Pequena e real. Eu poderia encarar isso como um problemão ou um problema do tamanho de uma pinta. E foi dessa última forma que eu agi. Até ver a outra pinta no pulso.