...VOCÊ
NUNCA ESQUECE
Realmente
estava um dia lindo. Nuvens escuras no céu; chuva constante desde a madrugada.
Era um sábado perfeito para assistir um filme. Após o café fui imediatamente à
locadora.
O
alugador estava organizando alguns filmes e disse que estava disposto a me
ajudar no que fosse possível. Agradeci e parti para a sessão de comédia.
Belíssiams
caixas vazias acomodavam-se nas prateleiras. Alguns eu já tinha visto. Outros
eu já tinha visto várias vezes. Peguei então um por acaso. O dono da loja – que
já havia cumprido sua tarefa – disse que esse filme ainda não tinha sido
alugado, pois, acabara de chegar na loja. Tremendo um pouco; devolvi. Peguei,
então, um dos que eu já tinha visto.
Dirigi-me
ao balcão para o procedimento de sempre e o organizador começou a puxar
conversa.
-
Que chuva, hein? Quando será que vai parar?
-
Ahn? Não sei.
-
A carteirinha.
-
Ah! Sim. Aqui.
-
Sabe de uma coisa? Eu não gosto de chuva.
-
Hum.
-
E você?
-
Eu o quê?
-
Gosta de chuva?
-
É...Tanto faz.
-
Sei. São dois reais.
-
Ah! Sim. Aqui.
-
E sabe qual é o pior de tudo?
-
Ahn? Não sei.
-
É um sábado!
-
Ah.
-
Sábado e chuva: péssima combinação.
-
É...
-
Pois é. Vou pegar seu troco. Ah! Já ia esquecendo. Estamos inaugurando um
sorteio hoje. O alugueu de um filme dá direito a um cupom. Você prrenche e
coloca nesta urna. O prêmio é um moderno aparelho de DVD. Aquele que está ali
no cartaz.
-
...
-
E então?
-
É...Você disse inauguração?
-
Sim. Começamos hoje. E como você é o primeiro cliente do dia...
-
Co-como assim? Pri-primeiro?
-
É. Primeiro cliente. O senhor está se sentindo bem?
Tirando
a gagueira, o suor frio e a vontade de desmaiar eu estava ótimo!
Respirei
fundo e lhe disse no tom mais calmo que consegui – que para ele deve ter parecido
com um surfista desesperado sendo atacado por tubarões – :
-
Eu desisti de alugar o filme.
-
Nossa. Mas por que?
-
Não é nada. Eu...apenas mudei de ideia.
-
Eu posso lhe indicar outro filme, então.
-
NÃO!
-
...
-
Não. Eu apenas quero o dinheiro de volta.
-
Ah. Ok. Aqui está.
-
Obrigado.
-
O senhor está realmente bem?
-
Estou. Sim. Ótimo. Estou. Obrigado.
Saí
tranquilamente da loja – que para ele deve ter parecido com um psicopata em
fuga alucinada.
Puxa
vida. Aquilo era constrangedor. Detestava quando acontecia. Tentei relaxar.
Caminhei por algun tempo e comprei um picolé de abacate. Picolé de abacate me
ajudava a relaxar.
Ainda
chovia quando voltei à loja. O alugador/organizador/dono da loja estava no
balcão atendendo uma velhinha. Ou melhor, estava explicando que não alugava
mais VHS.
-
Mas eu sempre alugava aqui por um cruzado.
-
Eu sei senhora. Mas isso já faz tempo...
Esperei
ele destruir as esperanças da pobre idosa e fui até o balcão com o mesmo filme
de antes.
-
Oi. É...eu vou alugar esse aqui.
-
Ah. Sim. Mudou de ideia, então?
-
É...Bom...É que...É que é compicado explicar.
-
A carteirinha.
-
Ah! Sim. Aqui. Bom. É que na verdade eu tenho um tipo de fobia.
-
Hum.
-
É. Sabe? Coisas relacioandas a ser o primeiro me deixam um tanto
que...desconfortável.
-
Sei. São dois reais.
-
Ah! Sim. Aqui. Pois é. Então por isso devolvi aquele filme, pois, ninguém tinha
alugado ele. E quando soube que era o primeiro cliente do dia e que ainda podia
estrear um sorteio fiquei um pouco...desconfortável – que para você deve ter
parecido com uma moça sofrendo uma extração dentária sem anestesia.
-
Ah. Não. Não.
-
Bom. Então foi isso o que aconteceu. Eu sei. É bastante diferente, mas é a
verdade.
-
É...
Nesse
momento a velhinha dos VHS – que ainda não havia desistido – me disse:
-
Olha meu jovem. Eu acabei ouvindo sua conversa e devo dizer que achei muito
estranho.
-
Ah! Sim. É. É realmente muito estranho.
-
E para falar a verdade você é a primeira pessoa, que eu conheço, que tem esse
tipo de fobia.
-
Ah...Mas que filha da p...
-
Seu troco, senhor.
MAX
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